Por Eduardo Peixoto, Luciano Ribeiro e Márcio Mará (matéria globoesporte.com)
Quando Patrícia Amorim assumiu o Flamengo, o clube vivia o frisson da conquista do título brasileiro no futebol, que não conquistava há 17 anos. Mas o início de 2010 não poderia ser pior. O time perdeu o Campeonato Carioca e começou a derrapar na Libertadores, até ser eliminado. A base de 2009 foi rompida com as demissões do vice de Futebol, Marcos Braz, e do técnico Andrade. Começaram as primeiras críticas. Zico assumiu a direção do futebol. Sem Adriano, Vagner Love e Bruno, o Brasileiro virou pesadelo. Reforços como Deivid, Diogo, Val Baiano e Renato Abreu surgiram com a competição em curso e ainda não corresponderam às expectativas.
- Foi uma surpresa o Renato chegar do jeito que chegou - afirmou a presidente, que aponta a má condição física como principal causa.
As negociações em busca de reforços deixaram em Patrícia uma grande frustração: o meia argentino Montillo, que acabou fechando com o Cruzeiro, era o seu favorito.
- Sinto muito quando o jogador quer vir, mas o empresário pega a proposta aqui, leva para outro lado e usa para conseguir algo melhor - desabafou a dirigente, que tem comos maiores sonhos de consumo repatriar Ibson, Juan e Julio Cesar. - Seria bom resgatar os nossos valores.
Outro que ainda tem as portas abertas para voltar é o técnico Andrade, apesar das cicatrizes deixadas por sua saída.
- Se encontrá-lo, vou cumprimentá-lo. Não é nada pessoal, amanhã ele pode estar aqui de volta. Mas quando há um desgaste, tem que dar tempo ao tempo.
Patrícia não se conforma de o ex-treinador, no dia de sua demissão, ter chegado atrasado para a reunião que selaria o seu destino junto com o vice de Futebol Marcos Braz, com quem tinha problemas.
- Era coisa de maluco. Um não estava satisfeito com o outro, sem contar com as brigas no vestiário, que começavam a ficar frequentes. Aliado a isso, teve um dia no hotel que o Andrade veio me perguntar se escalava o Pet ou não. Meu Deus do céu! Fiquei muito assustada. Vai perguntar para mim se tem que escalar ou não? - afirmou a dirigente, que falou ainda sobre o sonho de fazer triangular de futebol e basquete com Barcelona e Boca Juniors e sobre as dívidas do clube.
Veja abaixo a segunda parte da entrevista.
GLOBOESPORTE.COM: O Flamengo apostou alto em contratações como as de Deivid, Diogo, Val Baiano e Renato Abreu, que chegaram com problemas físicos e ainda não deram o retorno esperado. Como vê isso?
Patrícia Amorim: Acho que a gente aprende uma lição. O que acontece com jogadores de fora? Contratamos com currículo e imaginamos que vão chegar aqui muito melhores. O nome do Renato passaria por qualquer comissão técnica e torcedor. Foi uma surpresa ele chegar do jeito que chegou. Nesses campeonatos, eles jogam uma vez por semana, em campos menores. Não têm tanto desgaste, tantas lesões. O corpo demora um tempo a se acostumar com essa mudança. Isso tem reflexo no desempenho.
'O Montillo eu gostaria que tivesse vindo', afirmou
Patrícia
Dos jogadores que o clube tentou e não conseguiu contratar, qual o que lhe causou mais tristeza?
Montillo foi quem me deixou frustrada. Eu fico muito sentida quando o jogador quer vir, mas o empresário pega a proposta aqui, leva para outro lado e usa para conseguir algo melhor. E muitas vezes não volta para apresentar. O Montillo eu gostaria que tivesse vindo, sim. Estou falando como torcedora, é o que sinto mais. O Emerson também gostaria que viesse, porque sabia que ele queria. Fico triste quando o jogador quer vir e não consegue. Todo trabalho, quando não tiver prazer, realização, pode não render 100%. Acho que aqui talvez o Emerson estivesse mais feliz. Também chegamos a cogitar o Kleber, mas ele não queria vir e foi correto desde o começo.
Qual o seu sonho de consumo?
Tenho vários. Num primeiro momento, quero trazer os que foram daqui. Ibson é o primeiro porque acho possível. Juan, o zagueiro, também. E quem sabe o Julio César para o gol. Seria bom resgatar os nossos valores...
Ronaldinho Gaúcho, jogando o que vem jogando no Milan, ficou mais difícil?
O Ronaldinho eu acho difícil, mas não impossível. Daqui a seis meses ele pode se dar o luxo de vir para cá se quiser.
Patrícia sonha repatriar Julio César, Ibson e o zagueiro Juan
Traria de volta o Adriano?
O que acho bacana é que o Adriano passou por aqui, não saiu brigado e não fechou a porta. Mas hoje o clube tem um outro enfoque. Se nosso elenco estiver bem quando ele quiser voltar, não tem por que trazê-lo.
Quando você assumiu, encontrou o clube campeão brasileiro. Manteve a estrutura deixada pelo vice Marcos Braz, mas aí surgiram muitos problemas, e foi obrigada a tomar medidas. Arrepende-se de algo?
Não tenho sentimento de que seria melhor romper. Queria muito que tivesse dado certo, como no ano passado. Tanto que a ideia era manter todo o time. Do mais humilde funcionário até o vice-presidente de futebol. Mas não deu. Não me arrependo. As coisas se desencontraram. É como se a massa tivesse desandado.
'Quem segurou o Andrade fui eu. Braz preferia Roth',
afirma a presidente do Fla
O que houve, na sua opinião?
Cada um pensava por si, via o seu lado financeiro, pessoal, e o conjunto foi se desintegrando. Queria muito que tivesse dado certo. Pode ter certeza. Mas não deu. Tomo até cuidado porque o Andrade fala que a diretoria plantou matéria para dizer que não existia controle. Isso é uma completa irresponsabilidade, porque quem não o queria desde o começo era o Marcos Braz, que preferia contratar o Celso Roth. Quem segurou o Andrade fui eu. A coisa se agravou depois que vencemos o Caracas, e o Marcos Braz disse que o Andrade não era mais o técnico do Flamengo. Tudo isso é verdade. Sou a pessoa mais transparente do mundo.
E no dia da demissão do Andrade, o que aconteceu?
Chamei o Andrade para conversar às 13h30, e ele apareceu uma hora e meia depois com o Marcos Braz. Queria muito saber por que ele não veio na hora. Quando chegou aqui, só queria saber o que ia receber, se o prêmio seria pago... Era coisa de maluco. Um não estava satisfeito com o outro, sem contar as brigas no vestiário, que começavam a ficar frequentes. Aliado a isso, teve um dia no hotel que o Andrade veio me perguntar se escalava o Pet ou não. Meu Deus do céu! Fiquei muito assustada. Vai perguntar para mim se tem que escalar ou não? Não estou aqui de brincadeira, tenho que defender a instituição. Imagina se o Chupeta (técnico do basquete rubro-negro) ia me perguntar se coloca o Marcelinho ou não... Se ainda fosse uma conversa informal, um jantar e eu desse minha opinião... Mas não foi isso.
Nas recentes entrevistas, ele não esconde a mágoa com a saída...
Sou muito calma, mas tudo tem limite. Ele reclama que o Flamengo não pagou abril. Realmente. Estávamos tentando um acordo e não houve. Na quinta-feira, chegamos. Pelo menos foi o relato que tive do Michel Levy (vice de finanças). Existe realmente uma dívida, e a gente nunca escondeu.
Você parece muito chateada também com a situação...
Fiquei muito triste como presidente e torcedora . Quando vejo o Andrade chorar, me sinto como a pior pessoa do mundo. Meus filhos me cobram. Mas a vida continua. Lá na frente a gente pode se encontrar, não tem problema algum.
Voltaria a trabalhar com ele?
Se encontrá-lo, vou cumprimentá-lo. Não é nada pessoal, amanhã ele pode estar aqui de volta. Quando há um desgaste, tem que dar tempo ao tempo. Mas, neste momento, o desgaste era muito grande. Tinha problemas policiais, de disciplina. Treinador é um líder positivo, tem que ter participação.
Patrícia: 'Love não pôde ficar por circunstância. O
Adriano, também'
Mas era função dele punir? Não era o caso de o clube aplicar uma multa?
Punir o jogador que ganha não sei quantos mil não faz efeito. Chega uma hora que ele fala: “Vou faltar e pode descontar.” Não é esse o clima. Achei bem-sucedida uma relação que construí com o Love. No dia que ele não veio, eu disse: "Ou você vem e compensa no dia seguinte ou teremos que tomar atitude. Veio domingo, às 8h30m. Foi a maior resposta que tive. Nosso relacionamento é excelente. Ele não pôde ficar por uma circunstância, Adriano, também. Andrade não ficou porque o clima era insustentável. Mas é ídolo, merece todo o reconhecimento. Só não queria que tivesse fechado a porta comigo. Eu o chamei para conversar e ele não veio... Aí existe uma hierarquia. Sou presidente. Daqui a pouco o funcionário vai escolher o patrão. Ele não veio e já era indisciplina. Lamento tudo. Isso não construiu nada para o Flamengo. Destruiu. Talvez o fim não seria esse. Poderíamos ter conversado e resolvido. Eu não achava certo o Andrade pagar o pato, mas queria ouvir dele o que estava acontecendo. E não ouvi.
Qual o valor da dívida do clube?
Posso responder mais à frente, depois da auditoria. Vamos estudar o balanço para saber o valor. É muito provável que a gente encontre alguma diferença nesses R$ 330 milhões. A ideia é entregar o Flamengo melhor. Não tenho a ilusão de que vou resolver. Agora, títulos só vamos saber no fim.
E a dívida a com a BWA?
Já pagamos R$ 5,1 milhões à BWA. A dívida era de R$ 13 milhões. Nenhum centavo de bilheteria vem para o Flamengo. Vai direto. Cinco milhões a antiga diretoria pegou em dezembro para sair com os salários em dia.
Como estão as dívidas trabalhistas? E com os jogadores?
Pagamos 15% ao TRT rigorosamente e 5% ao Imposto de Renda. Quando falo com os jogadores explico isso: “Temos tantos milhões, mas só podemos passar a negociar tirando os 15% do TRT e os 5% do IR.” Não estamos com dívida alguma com federação. Cheguei aqui, e o Flamengo devia dezembro e 13º. Basquete, desde outubro, futsal, desde abril. Paguei tudo. Só temos dívidas de premiação. Fiz parceria com a Light, pagamos sempre a média de luz. Diminuímos 70% do nosso valor. E agora não pagamos mais multas. Aí começa a sobrar mais um pouco. O clube não tem fins lucrativos, mas não pode dar prejuízo.
A presidente rubro-negra diz que resolveu as dívidas do basquete masculino
Qual o próximo projeto a ser posto em prática?
O do Museu. Lançaremos a pedra fundamental no aniversário do Flamengo. A garantia é que esse dinheiro venha dos royalties que a Olympikus tem de nos dar.
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